quarta-feira, 1 de junho de 2011

A Escola de Chicago - contexto histórico da obra de Sullivan e Wright.

Os edifícios do Meio-Oeste americano do final do século XIX evidenciavam a luta para conciliar arquitetura e engenharia,buscando atender à diversas funções e que fossem,ao mesmo tempo,baratos,utilitários,rápidos,flexíveis e à prova de fogo.E a Escola de Chicago quem atendeu à essas demandas.
Em 1830,Chicago experimentava um crescimento excessivo,com uma população de mais de 1,5 milhão de pessoas.Criou-se,então,um grande complexo urbano nas margens do Rio Chicago,de forma simples e rápida,atendendo tal demanda de instalações comerciais e habitações.
No início,as construções eram preferencialmente em madeira,no estilo “balloon-frame”,introduzido em 1832.A partir de 1855,surgiam em Chicago algumas estruturas em ferro fundido,mas a maioria das casas continuava sendo construída em madeira.Porém,com o grande incêndio que atingiu a cidade em 1871,o risco que a madeira acarretava ficou evidente.Como as construções em ferro também se mostraram sensíveis ao fogo,passou-se a utilizar a pedra como material.
A reconstrução de Chicago tornou-se intensa entre,aproximadamente,1880 e 1900,surgindo um moderno centro de negócios,o Loop,com edifícios de escritórios,grandes magazines,hotéis e edifícios de apartamentos,muito próximos uns aos outros ,onde são experimentados novos sistemas construtivos para satisfazer as novas necessidades da cidade.Com isso,aumentaram as vantagens da construção em ferro.Além disso,a invenção das estruturas de aço resistentes ao fogo,novas técnicas de fundações resistentes e a invenção do elevador permitiram edifícios cada vez mais altos.



IMAGENS 1 E 2: Vista do Centro comercial de Chicago

A partir daí,o arranha-céu tornou-se um estilo natural de Chicago,no que se refere à aplicação prática,e próprio da cultura americana,no que se refere à criação de uma arquitetura moderna no país dotada de certa independência cultural.Os arranha-céus transformaram a cena arquitetônica tradicional e harmonizaram a cidade com as exigências da industria.
          Juntos com William LeBaron Jenney,que marca o inicio da Escola de Chicago com seus edifícios solucionando problemas da engenharia e suas fachadas em vidro e sem ornamentação,se destacam Daniel Burnham,John Wellborn Root,John Holabird,Martin Roche,Henry Hobson Richardson,Dankmar Adler e Louis Sullivan.
     A escola de Chicago foi a primeira a utilizar extensivamente as potencialidades técnicas do período,criando arranha-céus essenciais ao estilo natural de Chicago e dos Estados Unidos como um todo,no que se refere às aplicações práticas,e mudando a fisionomia da cidade moderna.As experiências desta escola são fundamentais para o movimento moderno,porém logo perdem força no fim do século,já que seus integrantes se voltam para dilemas culturais próprios,seja na volta aos estilos históricos,como Burnham,ou em experiências de vanguarda,como Sullivan e Wright.

Louis Sullivan – Uma obra pessoal como critica aos seus contemporâneos


Louis Sullivan formou-se no Massachusetts Institute of Technology e na Escola de Belas Artes de Paris.Neste tempo,trabalhou com Frank Furness,onde teve contato com seu estilo orientalizado,que o influenciou fortemente em seus ornamentos, e com LeBaron Jenney,com quem,em 1873,trabalhou em seu escritório passou a se ater mais às “funções suprimidas” da arquitetura.Já em 1887,com 30 anos,Sullivan se mostra muito impressionado pelo magazine Marshall,Field & Co de Richardson,inaugurado em 1887,e então decide sua vocação artística.
Em 1879 começa a trabalhar com Dankmar Adler,de quem viria a ser sócio e parceiro até 1895.Desde este período,Sullivan já estava convicto em fazer uma arquitetura completamente diferente de seus contemporâneos,com exceção de Richardson e Root. Sullivan os criticava,tendendo a se distinguir destes e a criar um estilo pessoal alternativo,ilustrando suas intenções através de suas obras construídas e escritos teóricos.Por isso ele é considerado entre Richardson e Wright,todos artistas de vanguarda que buscavam realizar uma arte verdadeiramente americana.
IMAGEM 3: Henry Hobson Richardson,Marshall Field Wholesale Store,Chicago,1885-7

As ambições de Sullivan já são vistas em seus primeiros trabalhos,como o Rotschild Building de 1881,com muita decoração em ferro gusa e pedra esculpida.
Em 1886,Adler e Sullivan recebem o projeto do Auditorium,um conjunto de edifícios que marca o inicio do desenvolvimento do Loop e sua tendência de abrigar não só escritórios,como hotéis e apartamentos.Este complexo abrigava,além do auditório,um conjunto de escritórios e um amplo hotel.Esta obra mostra sua forte influencia vinda da integridade do projeto do Marshall,Field & Co. de Richardson.No Auditorium,ele e Adler empregam alvenaria tradicional,completada por ferro,onde as aberturas externas são organizadas em malha.Na fachada,a decoração quase não aparece e a organização da perspectiva do edifício é obtida pela disposição das massas e materiais.Os exteriores do Auditorium marcam a luta de Sullivan para conciliar a alvenaria com as possibilidades internas permitidas pela trama estrutural.No Auditorium,a atenuação vertical e a pequena profundidade dos principais fustes de colunas e pilastras antecipavam as soluções dos arranha-céus de Sullivan.


IMAGEM 4: Louis Suillivan e Dankmar Adler,Edifício Auditorium,Chicago,1886-9

A partir de 1890,Sullivan utiliza seus princípios de composição nos arranha-céus,em que acreditava que a função deveria ter uma identidade na forma. Enquanto Richardson acentuava suas fachadas grandiosas e lisas com abertura de janelas e arcos redondos,Sullivan,em seu artigo The Tall Office Bulding Artistically Considered, as obras de edifícios de escritórios deveriam seguir três funções: os primeiros pavimentos estavam destinados às moradias e ao acesso aos pisos superiores;acima destes,um número indefinido de pavimentos-tipo de escritório,com um quadriculado uniforme de janelas e pilares constituindo a fachada;e o piso superior,que abriga a parte técnica do edifício,destaca-se como um sótão de encerramento do edifício.Assim,os arranha-céus adotavam o ideal típico de base,fuste e capitel das colunas clássicas.Nasce assim,o Verticalismo,típico dos arranha-céus de Sullivan.Para Sullivan,o arranha-céu era o produto inevitável de forças sociais e tecnológicas
Sullivan acreditava que a composição em perspectiva era natural e harmonizável com a função do edifício.Ele pensa em uma arquitetura regulada pelas necessidades objetivas,em que a sua própria fantasia apenas acentuava os caracteres fundamentais do edifício.Contudo,ele destaca que sua descrição teórica lhe permite uma expressão arquitetônica inédita,enquanto que o ritmo indefinido dos pavimentos-tipo não é compatível com a composição base-zona intermediária-sótão.

Na obra do magazine Carson,Pirie & Scott,Sullivan atinge o máximo de suas capacidades.A trama arquitetônica recebeu uma ênfase horizontal,com variações nas alturas dos pavimentos,dando vitalidade à forma geral.Apesar de seu caráter complexo,este edifício mantém uma grande força expressiva,com seu interior com grandes áreas livres e sua fachada com as grandes “janelas de Chicago”.Curiosamente,esta obra como um todo apresenta mais as características das obras da Escola de Chicago,do que o estilo pessoal de Sullivan,tradicionalmente vertical.
IMAGEM 5: Louis Sulliva,Loja Carson,Pirie & Scott,Chicago,1899-1904

Sullivan recorria a certas formas monumentais, principalmente em mausoléus, com grande utilização de pedra em composições assimétricas. Já em construções urbanas, combinava formas clássicas com pedra, enquanto misturava estilo Gótico com tábuas em construções rurais.
A linguagem arquitetônica de Sullivan é muito variável entre uma obra e outra,podendo ser melhor entendida em seus ensaios teóricos.Por isso,esta diferença entre a teoria e a pratica pode ter sido uma das razões de seu fracasso profissional,principalmente após o fim da parceria com Adler e o fim das obras do magazine Carson,Prie & Scott
Louis Sullivan influenciou toda sua geração seguinte de arquitetos do Meio-Oeste,em que Frank Lloyd Wright destacava-se.

A influência de Louis Sullivan na obra de Frank Lloyd Wright.

Frank Lloyd Wright começou a trabalhar como assistente no escritório de Adler e Sullivan em Chicago em 1887, quando ele desenvolvia o Auditorium, e de seus mestres recebeu influências que carregou por toda sua carreira.
Desde o começo,Wright tem as mesmas ambições de Sullivan.Sullivan e Wright procuravam criar uma arquitetura para o “Novo Mundo”, uma arquitetura em que a forma seguisse a função, uma arquitetura igualitária.Porém,Wright não enfrentou as inquietações e dificuldades que Sullivan provou em sua tentativa de interpretar a realidade específica da vida em Chicago.Desde o princípio,os termos com que Sullivan descrevia a sociedade de seu tempo e formulava problemas arquitetônicos,eram para Wright realidades certas e indiscutíveis.Wright acreditava em um estado natural,um aspecto genuíno da vida que é escondido por imposições e coerções externas,que caso fossem esquecidas,permitiram o surgimento de uma arquitetura livre de todo conformismo e sistema normativo.
Os dois tiveram contato com a obra de um celta, Owen Jones, que publicara Grammar of Ornament (Gramática do Ornamento) em 1856. Nessa obra, Owen usava como exemplos ornamentais muitas obras de origem indiana, chinesa, celta, egípcia e assíria. Foram nesses exemplos que Sullivan e Wright basearam sua busca em um estilo em que pudessem incorporar o Novo Mundo. Essas influências podem ser encontradas tanto na obra de Sullivan, com seus ornamentos geométricos, quanto na de Wright.Um exemplo são as influências turcas na Charnley House de Sullivan,em Chicago,de 1892,que contou com a colaboração de Wright.

IMAGEM 6: Charnley House,Chicago

Como todo pioneiro, os dois foram rejeitados a princípio pela sociedade e pelos críticos, e sua importância na história da arquitetura mundial demorou a ser reconhecida. Durante o início do século XX as construções americanas sofriam grande influência de clássicas e góticas, nesse período, tanto Wright como Sullivan viveram quase que exilados em seu próprio país. Sullivan chegou até mesmo a receber ajuda financeira de amigos no final de sua vida,enquanto Wright não contava com a ajuda dos artistas de sua época, tinha ele mesmo que projetar suas janelas e vidraças, os detalhes arquitetônicos e a ornamentação.Eram considerados por seus contemporâneos representantes de uma causa perdida.
Wright descrevia sua arquitetura como um estilo independente de toda imposição externa,de todo o classicismo,de todo o padrão comercial ou acadêmico.Essas afirmações devem ser levadas em consideração ao analisar sua posição de projetista.Dessa maneira,ele pode projetar e prever os efeitos espaciais da forma de maneira muito superior a vários arquitetos.Porém,a principal diferença de Wright não se encontra apenas em suas preferências formais,mas na sua segurança e sistematicidade na invenção,em que funde suas diversas contribuições estilísticas e cria uma linguagem fluida e individualista,ao contrário de Sullivan e seus contemporâneos,que projetavam hesitantes quanto aos obstáculos das varias exigências abordadas em seus projetos.
Em toda sua carreira,Wright construiu principalmente casas,as chamadas prairie houses,que mesmo seguindo um programa arquitetônico por ele criado,resultou em arquiteturas diversas e desconcentradas. Sempre teve em sua mente ao projetar a idéia de criar um habitat ao ser humano, isso explica a utilização em larga escala de materiais em seu estado “bruto”. Tinha o objetivo de construir “a casa como abrigo”. Suas casas se baseavam principalmente em uma planta cruciforme, formando dois volumes com alturas diferentes, com a chaminé no centro.  Em algumas construções, como a casa de Isabel Roberts, Wright propunha uma planta mais livre e adaptada ao terreno. Em sua própria casa em Taliesin, ele alcançou uma planta livre e flexível,utilizando de contribuições de seu período na Europa,mas sem mudança no seu modo de projetar. Wright criara uma flexibilidade inédita ao interior das casas.

IMAGEM 7: Casa Isabel Roberts,Illionis,Frank Lloyd Wright

IMAGEM 8: Casa Taliesin,Winsconsin,Frank Lloyd Wright

Wright buscava a construção de uma “arquitetura orgânica”, como ele mesmo a denominava. Era uma arquitetura que buscava fundir a forma com sua função. Como Sullivan definiu “Orgânico significa a procura de realidade- uma palavra que adoro, pois adoro o sentido vital que representa, o agarrar as coisas com todos os dez dedos”.Alguns críticos adotam essa linguagem orgânica de Wright como uma alternativa ao movimento moderno.Segundo o próprio Wright,ele estava distante do movimento moderno e não estava disposto a abandonar sua posição individualista,pois concebia a arquitetura como representação ideal do mundo e,por isso,transferia os problemas da sociedade contemporânea para uma natureza imaginária,onde poderiam ser resolvidos apenas por questões formais.

Um paralelo entre Sullivan e Wright

Tentando traçar um paralelo entre as obras de caráter pessoal de Louis Sullivan e Frank Lloyd Wright,encontramos nos autores estudados uma linha de pensamento em comum: ao mesmo tempo em que Sullivan e Wright compreendiam e aceitavam os desafios da sociedade contemporânea e dos materiais disponíveis,criavam uma arquitetura experimentalista de vanguarda,fugindo da linguagem comum à seus contemporâneos,que muitas vezes recorriam ao classicismo.Os dois buscavam,de maneira semelhante aos movimentos europeus,mas sem influências externas,criar um estilo propriamente americano.Porém,a obra de Sullivan possui mais contradições,devido aos obstáculos da demanda do período em que foi criada,na Chicago em plena reconstrução pós-incêndio ,enquanto Wright,de uma segunda geração da Escola de Chicago,pôde criar seu próprio estilo.